A linguagem do coração em Assis
Cada rua, cada via que tomamos está permeada pelo amor de Francisco e seus seguidores, especialmente Clara. Procuro ter cuidado ao falar dos humanos que se tornaram santos. Pessoas como nós, que escolheram viver no caminho da Igreja de Cristo e, com suas obras, alcançaram o máximo de suas potencialidades, tornando-se exemplos de humildade e fé. Inspiram não apenas os católicos, mas também os curiosos sobre esse modo de vida. É desse lugar que falo: das pessoas que descobrem a vida de outras que viveram um ideal e concluíram uma bela obra.
É em Assis que minha alma vem sendo levada. Mas como é isso? O que é “ser levada”? Parece fantasioso, mas não é. Também não é uma escolha consciente. É quando os olhos se abrem mais do que o normal para algo que chega até nós. É o interesse se manifestando: ouvir uma história, uma experiência, e logo entrar nesse mundo, imaginando-se como protagonista. É uma voz que fala do lado de dentro. Todos nós a possuímos, embora o mundo das distrações dificulte o acesso a ela.
Essa é a linguagem do coração. Só conseguimos senti-la quando nos concentramos no momento presente.
Nunca acessaremos essa voz se, enquanto um amigo fala, olhamos para o lado ou checamos o celular a cada minuto. É um estado de estar onde realmente estamos. Apenas isso permite que a inteligência divina se manifeste. Foi assim que Assis se fez presente dentro do meu coração.
Uma segunda-feira especial
Não foi uma segunda típica, como a de hoje, enquanto escrevo após acordar, ver a agenda, organizar compromissos da casa e me preparar para trabalhar. Não. Naquele 28 de outubro, acordei e peguei a estrada para Assis. Mattia me olhou surpreso: “Já está pronta?”. E eu, sorridente e cheia de vida, disse: “Sim.” Um “sim” carregado de verdade.
No carro, me acompanhava o medo. Um medo já conhecido e trabalhado. Decidi que o levaria no banco do carona. Não o rejeitei, nem o expulsei dizendo que não fazia mais sentido estar ali. Afinal, se ele estava presente, talvez ainda houvesse algo a ser feito. Assim, o medo me fez companhia até que mostrei que não precisava mais voltar. A mensagem já havia sido recebida, o cuidado já estava tomado. Insistir nele seria ultrapassar o ponto e cair no controle e na preocupação desnecessária. Controlar a vida não é sábio. Isso consome energia e mina possibilidades.
“Mas e se tudo der errado? E se você bater o carro? E se o lugar escolhido para o encontro não for bom? E se houver barulho demais? E se a internet não funcionar? Ou, ainda, se você não souber o que falar?” — medo, medo, medo. Controle, controle, controle. Ao dizer ao medo para partir, fiquei com o silêncio. Não quis ouvir música; era muito cedo, e o silêncio me parecia mais adequado. Entre uma Ave-Maria e outra, respirava aliviada, apreciando as belas paisagens. Segui firme, calma e atenta. Feliz pelo encontro que me aguardava.
Conexão de alto nível
Hoje, “conexão” virou sinônimo de internet, e sou uma entusiasta dela. Mas quero falar de uma conexão que também não vemos, mas que se materializa de formas inesperadas, ainda que nem sempre compreensíveis.
Cheguei ao estacionamento da Basílica de Santa Clara, chamado Porta Nuova. Um belo portal marca a subida das escadas até o centro. Subi, abrindo-me para o dia que me aguardava. Olhava ao redor como quem chega a um mundo novo. Esse tipo de olhar é vital. Sempre temi a monotonia, os dias iguais sem uma pausa para algo novo. Explorar novos lugares é essencial. E esses lugares podem ser uma esquina que nunca viramos, um café que adiamos conhecer, ou até uma conversa com alguém que cruzamos diariamente, mas com quem nunca passamos da formalidade. Há tantas formas de encontrar o novo — basta abertura, curiosidade e criatividade.
O risco de terminar a vida com um repertório pobre é real se nos fecharmos na mesmice. O coração humano foi feito para o encontro, para crescer através de mãos que se tocam e olhares que se comunicam.
Tudo isso me lembra que, embora viajar seja a máxima experiência de novidade, podemos criar “mini encontros” que mudam nosso humor e dão ânimo ao cotidiano. Claro, coisas ruins acontecem, pessoas difíceis cruzam nossos caminhos. Sabemos que o mundo não é encantado, mas ainda assim, há encantamento. Sejamos exploradores desse encanto.
Tudo na vida é uma questão de escolha. Ainda que sua “vítima interior” diga que está tudo difícil e que nada pode mudar, pensamentos negativos deturpam nossa visão. Mesmo um pequeno lampejo de esperança tem o poder de transformar. Estamos aqui para crescer, para aprender a amar. E a vida nos oferece pessoas e situações para nos desafiar e ensinar.
Foi assim que, ao encontrar uma pessoa extremamente doce e agradável, abasteci meu coração. Nem consigo ainda expressar tudo o que vivi naquele dia de outono em Assis. Além de Clara e Francisco, fiz mais uma amizade de valor inestimável. Dei as mãos à parte boa da vida e decidi seguir mais forte e inteira.
Seguindo os caminhos de Assis, meus olhos não se contentavam em ver sozinhos. Pensava em tantas pessoas que sei que gostariam de estar ali, especialmente meu trio do encontro: Marina e Renata. Fazia fotos e vídeos para Marina, no Brasil, enquanto sabia que Renata, do outro lado, fazia o mesmo. E ao encontrá-la, senti a força da união daqueles que olham para o mesmo farol. Selamos ali uma amizade franciscana, pautada na fé, na criação e na abertura para a vida, com tudo o que ela nos traz.
Em breve, escreverei sobre fatos interessantes da vida dos santos que inspiraram esse encontro. Quero mostrar como, ainda hoje, eles nos ajudam — seja em nossas vidas ou em nossos projetos. Seguimos caminhando: para frente e para o Alto.